Resistências

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Publicado Segunda, 04 de Agosto de 2003 às 07:18, por: CdB

 
Conceição das Crioulas é uma comunidade remanescente de quilombo, localizada no semi-árido pernambucano, a cerca de 500 Km da capital. Criada no século XVIII, por seis mulheres, a comunidade tem muita história pra contar. Desde os tempos da escravidão, até os dias de hoje, sua população  briga por liberdade, direitos e qualidade de vida: educação, saúde, trabalho, terra. E também por respeito e valorização de suas origens.
 
O título de posse da terra de 17 mil hectares localizados no município de Salgueiro, concedido pelo governo federal em 2000, representa apenas 30% da área original. Mesmo com a titularidade, as invasões por grileiros e os conflitos são constantes na vida dos seus quatro mil habitantes. Mas as vitórias superam as dificuldades.
 
Conheça mais de Conceição das Crioulast a partir da entrevista – dada ao IbaseNet - com Givânia Maria da Silva, 36 anos, professora, vereadora pelo PT, que vem aproveitando bem o legado de guerreira deixado por suas ancestrais.

- Como nasceu a comunidade Conceição das Crioulas?

- Como não tínhamos registros oficiais, no final dos anos 1980, procuramos resgatar nossa história na oralidade, entre as pessoas mais velhas da comunidade. A curiosidade começou quando percebemos que esbarramos em parentes em cada lugar que vamos. Até o nome gerava curiosidade, por que Conceição das Crioulas e não dos crioulos? As pessoas mais velhas informaram que Conceição surgiu de um grupo de seis mulheres negras, que estavam fugindo – não conseguimos descobrir ainda de onde, esse roteiro não está claro. Pela época, sabemos que foi no mesmo momento em que se acirrou a perseguição ao Quilombo dos Palmares e a todos os agrupamentos de negros. Fugindo, elas resolveram se abrigar nessa região, cercada pela serra, de difícil acesso.

Aos poucos, outras lideranças foram chegando e, sendo vizinha à comunidade indígena Atikum, houve rapidamente entrosamento e o conseqüente crescimento dessa comunidade. Descobrimos que as fundadoras firmaram um compromisso de que se chegassem a ter a posse da terra, dedicariam um terreno à construção de uma capela em homenagem à Nossa Senhora da Conceição. Isto porque uma outra pessoa que chegou depois delas, um senhor, trazia a imagem da santa. Em 1º de janeiro de 1802, elas conseguiram a posse. É uma comunidade marcada pela luta feminista, desde a sua origem.

- Por ser professora e vereadora, você se tornou uma exceção na sua comunidade que até pouco tempo só contava com escolas de ensino fundamental. Como se deu a luta pela melhoria da educação local?

– Começamos a brigar pela educação no começo dos anos 1990, quando só tínhamos escolas até a 4ª série e outras regiões do município já contavam com unidades até a 8ª série. Por que justamente Conceição, que abriga a maior população do município, não tinha? Também não contávamos com transporte escolar para que os estudantes se deslocassem para o Centro, a 50 Km. Era como se as pessoas de fora estivessem nos dizendo, de várias formas, que teríamos que parar por ali.

Acabamos conseguindo trazer o ensino até a 8ª série, em 1995, mas, em discussões com a comunidade, concluímos que só a escola, no formato em que se apresenta, não responderia às nossas necessidades, pois não refletiria a realidade local. A partir daí, decidimos introduzir o que chamamos de Currículo Vivo, ou seja, antes de aprender História e Geografia como são ensinadas em todos os lugares, as crianças aprendem primeiramente essas disciplinas sob o prisma da trajetória de Conceição. E hoje, os especialistas em Educação estão valorizando muito a inovação. Como professora, acredito que só a educação pode mudar essa triste realidade de miséria que vemos hoje no país. Mas é importante cada local valorizar sua origem. Como o menino quilombola pode falar da história dele, se não está escrita em nenhum dos livros didáticos?

- Qua

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Edição digital

 

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