Populações indígenas brasileiras sofreram ataques bioterroristas

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Publicado Segunda, 15 de Outubro de 2001 às 16:00, por: CdB

O terrorismo bacteriológico, que aterroriza o mundo ocidental desde que começaram a aparecer correspondências infectadas com antraz no Estados Unidos, não é uma novidade na história do Brasil. Embora não tenham sido cientificamente comprovados, são muitos os relatos de contaminação deliberada de populações indígenas brasileiras pelo menos até os anos 60. "Esse é um assunto que merece ser melhor pesquisado, tanto nas fontes históricas, como na memória oral de índios ainda vivos", avalia o antropólogo Carlos Alberto Ricardo, do Instituto Socioambiental (ISA), entidade que vem reunindo informações já publicadas sobre esses casos. Para o antropólogo, divulgar informações sobre o assunto é uma contribuição à consolidação dos direitos coletivos permanentes dos índios brasileiros. "O fato de que muitos povos indígenas foram exterminados por doenças trazidas pelos brancos é um assunto bem documentado por antropólogos, historiadores e epidemiólogos. Mas não é disso que se trata. A contaminação deliberada de índios foi usada historicamente no país para limpar áreas inteiras à expansão do latifúndios", diz. Segundo o levantamento, a primeira utilização de guerra bacteriológica conhecida no Brasil aconteceu em Caxias, no Maranhão, em 1815, e foi citada pelo antropólogo Mércio Pereira Gomes, em seu livro Os índios e o Brasil (Editora Vozes, 1988). Na época, índios Canelas Finas estiveram naquela localidade durante um epidemia de varíola. "As autoridades lhes distribuíram brindes e roupas previamente contaminadas por doentes. Os índios pegaram a doença e, dando-se conta do caráter do contágio, fugiram para os matos. Os sobreviventes contaminaram outros mais e, meses depois, essa epidemia alcançava os índios já em Goiás". No mesmo livro, Gomes diz que, no fim do século XIX, os "bugreiros de Santa Catarina e Paraná, financiados por companhias de imigração, deixavam em pontos determinados de troca de presentes com índios (xoklengues e caingangues), cobertores infectados com sarampo e varíola". As informações mais contundentes e completas, porém, fazem parte de um relatório produzido em 1967, pelo então procurador geral da República Jader Figueiredo, e divulgado em março de 1968, pelo ministro do Interior, Albuquerque Lima. Com mais de cinco mil páginas e 20 volumes, o relatório trazia casos de corrupção no extinto Serviço de Proteção ao Índios e massacres de tribos inteiras a dinamite, metralhadoras e envenenamento por açúcar misturado com arsênico. Embora tenha sido dado como desaparecido tempos depois de sua divulgação, informações do relatório são citadas por vários autores, como o antropólogo norte-americano Shelton Davis, no livro Vítimas do Milagre - O desenvolvimento e os índios no Brasil (Zahar Editores, 1978). Nele, o autor afirma que "continham provas que confirmavam as denúncias de que agentes do SIP e latifundiários haviam usado armas biológicas e convencionais para exterminar tribos indígenas. Indicavam a introdução deliberada de varíola, gripe, tuberculose e sarampo entre tribos da região do Mato Grosso, entre 1957 e 1963. Além disso, os arquivos do Ministério do Interior sugeriam ter havido a introdução consciente de tuberculose entre as tribos do norte da Bacia Amazônica entre 1964 e 1965". Criada a partir da repercussão do relatório na imprensa internacional, a organização britânica Survival International publicou no ano passado o livro Deserdados - Índios do Brasil, que também faz referências ao documento: "Havia relatos de que grupos de pataxós foram propositadamente infectados de varíola; que os tapayúna (beiços de pau) foram envenenados com arsênico e veneno de formiga...". Mas o caso mais impressionante, entre os levantados pelo ISA, é o relato do naturalista inglês Alfred Russel Wallace, no livro Viagens pelos rios Amazonas e Negro (Edusp/Editora Itatiaia, 1979), publicado pela primeira vez em 1853, sobre o encontro com um padre quando se dirigia ao povoado de Pedreira, no rio Negro: "...passamos a

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