Política suíça se polariza

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Publicado Segunda, 18 de Julho de 2011 às 08:20, por: CdB

Cada vez menos específico, mas mais polarizado do que em outros países: estes são os traços característicos do sistema político suíço, em comparação com outros países da Europa.

Essa polarização também deve ser reforçada após as eleições legislativas de outubro.

Na Suíça, cultivamos a "ilusão de um acordo, quando na realidade se está em um sistema de alto conflito político", afirma Pascal Sciarini, professor de ciência política da Universidade de Genebra. Questionado à margem de uma conferência interdisciplinar sobre partidos que decorreu na Universidade de Lausanne, ele observa a necessidade de uma "conscientização" coletiva.
 
O processo de transformação da paisagem política suíça começou em silêncio na década de 1970, se formando mesmo na década de 1990, lembraram os especialistas na conferência. Segundo eles, em vinte anos, a Suíça passou do reino da cultura do consenso para o estado de país mais polarizado da Europa.
 
Uma situação destacada por uma extensa pesquisa comparativa realizada pelo portal Europrofile, que teve a participação dos 27 países da União Europeia, Suíça, Turquia e Croácia. "Quando olhamos para os programas políticos de vários países, vemos que na Suíça as diferenças são mais extremas", explica Andreas Ladner, professor no Instituto Superior de Administração Pública (IDHEAP) em Lausanne.
 
De acordo com Ioannis Papadopoulos, professor de ciência política da Universidade de Lausanne, dois elementos se combinam para chegar a esta situação. "Primeiro, o reforço da separação entre a esquerda e a direita, especialmente em questões de política econômica, fiscal e social. Além disso, há um outro tipo de clivagem, os que são contra e os que são a favor de uma certa abertura da Suíça para o exterior".

Direita fragmentada

Para as eleições de 23 de outubro, os especialistas prevêem um aumento ainda maior da polarização. Os resultados de várias eleições estaduais e de pesquisas realizadas para as eleições federais indicam de fato que o Partido do Povo Suíço (SVP, na sigla em alemão) deve crescer ainda mais, passando do limite de 30%. Os socialistas e os verdes deverão permanecer mais ou menos estáveis e a direita deve sair ainda mais fragmentada.
 
A percentagem total de votos recolhidos pelos partidos de centro-direita deve permanecer em torno de 30%. Mas haverá dois partidos a mais do que em 2007 na disputa: o Partido Democrático Burguês (PDB), que surgiu em 2008 da divisão do Partido do Povo Suíço, e os Verdes Liberais, presentes em apenas cinco cantões há quatro anos atrás, mas agora em quinze.
 
O surgimento dessas duas formações deverá deteriorar o PLR (Partido Liberal radical) e o PDC (Partido Democrata Cristão). "É uma aposta certa de que os dois partidos históricos vão sofrer mais uma vez", prevê Pascal Sciarini.

Concordância de geometria variável

Enquanto que o cenário político muda profundamente, as instituições, no entanto, permanecem as mesmas. Isto tem efeitos importantes sobre a política suíça, cujo "sistema é baseado em negociações que devem alcançar uma solução consensual", diz Andreas Ladner.
 
Com dois pólos partidários- o SVP à direita e o Partido Socialista à esquerda - “o resultado das negociações não é claro, pois depende de acordos com outros partidos", comenta Ladner.
 
Assim, as decisões parlamentares tornaram-se o resultado de negociações de “geometria cada vez mais variável. Alianças objetivas tornaram-se cada vez mais móveis e imprevisíveis. Hoje há uma maior instabilidade. Até agora, conseguimos limitar os danos, mas não tenho certeza de que possamos continuar assim por muito tempo", declarou Pascal Sciarini.

Sistema esquizofrênico

"Já existe hoje na Suíça uma espécie de esquizofrenia entre os resultados e as decisões tomadas no sistema político. De um lado, um partido, o SVP, que ganha as eleições, mas não faz política, e de outro, o PLR e o PDC, que fazem política, mas perdem as eleiçõe”, conclui Sciarini.
 
Segundo ele, 80 a 90% dos votos no Parlamento são o PLR e o PDC que formam uma maioria com alianças. Mas o cientista político adverte que, se estes partidos continuarem perdendo eleitores, “eles chegarão a um ponto onde já não serão fortes o suficiente para fazer política".
 
Por outro lado, "às vezes acontece no Parlamento a formação de alianças entre o PS e o SVP, que por razões diametralmente opostas torpedeiam projetos importantes", diz o analista político Oscar Mazzoleni, responsável de formação e pesquisa na Universidade de Lausanne. Essas alianças, também chamadas de "contra a natureza", são formadas raramente. Desde 1996, elas fizeram a diferença em apenas 1,5% das decisões do Parlamento. Mas sua forma preocupa os especialistas. Na verdade, são sempre alianças "destrutivas", como reconheceu o deputado do SVP Jean-François Rime.

Difícil de governar juntos

Os problemas causados pela polarização são ainda mais evidentes no nível executivo. "Os dois partidos que se beneficiaram com a polarização - e que de fato a criaram - ou seja, o SVP e o PS, ainda estão juntos no governo, mas não são mais capazes de governar juntos", constata Pascal Sciarini.
 
"Isso também é evidente nas votações populares. Não há praticamente mais nenhuma onde o Conselho Federal (governo) não tenha que lidar com pelo menos um partido do governo, tanto com o SVP ou com o PS."
 
Última, mas não menos preocupante das consequências da polarização para Pascal Sciarini: "Todos os partidos estão em campanha permanente. Hoje, todos os partidos estão lançando iniciativas populares, mesmo aqueles que quase nunca fizeram isso. Todos parecem muito mais preocupados com os resultados das eleições do que com as decisões políticas necessárias para encontrar soluções aos problemas do país".

Sonia Fenazzi, swissinfo.ch
Adaptação: Fernando Hirschy

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Edição digital

 

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