"O risco de uma desaceleração global vai aumentar"

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Publicado Quarta, 21 de Setembro de 2011 às 13:26, por: CdB

"O risco de uma desaceleração global vai aumentar"Em entrevista à Carta Maior, o diretor da agência classificadora de riscos chinesa Dagong, Guan Jianzhong, analisa a economia brasileira no marco da atual crise econômica mundial. Para Jianzhong, o risco de uma desaceleração global vai aumentar e afetará as exportações brasileiras. Contradição entre necessidade de crescimento e controle inflacionário e investimentos insuficientes em infraestrutura e educação são gargalos para o crescimento, adverte.

Marcelo Justo - Direto da China, Especial para a Carta Maior

Desacreditadas pelo estouro de 2008, as agências classificadoras de risco estadunidenses seguem sendo um pilar essencial do capitalismo financeiro mundial. Suas avaliações são citadas e seguidas com fidelidade canina tanto pelos meios de comunicação como pelos investidores: suas classificações colocam países e regiões contra as cordas. No marco da União Europeia vem se falando desde a queda do Lehman Brothers da necessidade de contar com uma agência classificadora própria, mas em meio à atual turbulência ninguém moveu um dedo para isso.

Na China, reflexo de sua crescente confiança em nível mundial, a agência classificadora de riscos Dagong, está aumentando sua presença no mundo. Com um enfoque que se mantém no marco de certa ortodoxia econômica, mas incorporando alguns critérios próprios, a Dagong qualifica os países mais por seu potencial de crescimento econômico que por sua capacidade de se endividar nos mercados. Essa diferença de enfoque levou-a a reduzir há quase dois anos a classificação da dívida dos EUA e a adotar classificações “heterodoxas” para países europeus e latino-americanos. Em conversa com a Carta Maior, o diretor da Dagong, Guan Jianzhong, analisou a economia brasileira no marco da atual crise econômica mundial.

Qual sua avaliação sobre o rumo atual da economia brasileira?

Nos últimos anos, o Brasil mostrou sua fortaleza econômica não só pelo constante crescimento da produção, mas também por sua capacidade de absorção da crise financeira global que teve um impacto limitado no país se comparamos com o que aconteceu com outras nações. De fato, o Brasil foi um dos primeiros países em nível mundial a sair da crise. Isso se vê em seu crescimento de 7,5% em 2010, que o converteu no quinto país do G20. Mas o certo é que hoje o governo enfrenta uma forte contradição entre a necessidade de crescimento econômico e o controle inflacionário.

A este problema se somam outros de mais longo prazo como a disparidade entre ricos e pobres e as insuficiências nos investimentos em infraestrutura, educação e tecnologia que podem se converter em um gargalo para o crescimento. Em meio a estes problemas, vemos positivamente o fato de que o Brasil seja o organizador da Copa do Mundo em 2014 e dos Jogos Olímpicos em 2016, fatores que vão estimular o crescimento econômico.

Um grave problema da política antiinflacionária do governo é que ela gera um núcleo de especulação financeira que está prejudicando a economia em seu conjunto.

Desde 2010, o Brasil aumentou 8 vezes as taxas de juros levando-as de 8,75% para 12,50%. Se deduzirmos o fator inflacionário, a taxa é de 6,8%, muito mais alta que a do Chile que é de 1,5%, do México (1,1%) e da China (1%). Essa taxa atraiu os especuladores, encareceu o valor da moeda e se converteu em uma carga para as empresas e seu setor exportador. É preciso não esquecer também o impacto que estas taxas de juro têm no consumo privado que, nos últimos anos, vem representando 60% do PIB.

O governo lançou um programa de estímulo de 16 bilhões de dólares para contrapor essa perda de competitividade industrial. Isso é suficiente?

Este programa não ataca as causas do problema, mas sim os sintomas. Se, por um lado, pode servir para estimular a economia no curto prazo, no longo prazo, o Brasil deveria investir mais em educação, tecnologia e infraestrutura e insistir em um desenvolvimento próprio da inovação do Estado e das empresas.

Os próximos meses serão muito complicados para a economia mundial. Qual pode ser o impacto deste momento sobre a economia brasileira?

O risco de uma desaceleração global vai aumentar e afetará as exportações brasileiras. Enquanto isso, é provável que haja uma nova rodada de estímulo financeiro do mundo desenvolvido para estimular a economia. Esse vai-e-vem financeiro, a crescente flutuação do preço dos produtos primários e a pressão inflacionária restringirão a margem de manobra do governo.

Na relação China-Brasil, o governo de Lula quis criar uma complementariedade bilateral. Muitos funcionários brasileiros se queixam de que isso não está ocorrendo e que a China só vê o Brasil como um provedor de recursos naturais. É possível superar este tipo de dinâmica?

Existe uma grande complementariedade entre Brasil e China. O comércio bilateral aumentou de maneira notável. No último registro, o déficit bilateral chinês é de mais de 13 bilhões de dólares. O crescimento econômico chinês se baseia no investimento em construção e urbanização que oferece excelentes oportunidades para a estratégia de globalização das empresas brasileiras. A isso se soma o potencial de cooperação que há em termos de exploração energética, segurança alimentar e desenvolvimento de produtos técnicos. O Brasil é o mais importante sócio comercial do BRIC e o nono da China em nível mundial. Acreditamos que ambas economias estão se complementando e se beneficiando com este crescimento do comércio bilateral.

Tradução: Marco Aurélio Weissheimer


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