Esperança e medo: Sem medo de ser feliz

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Publicado Quarta, 30 de Outubro de 2002 às 08:11, por: CdB

Em seu primeiro pronunciamento como o novo presidente eleito, Luís Inácio Lula da Silva declarou, entre várias questões importantes, que: "O Brasil está mudando em paz. E, mais importante, a esperança venceu o medo. E hoje eu posso dizer para vocês que o Brasil votou sem medo de ser feliz". Se recordarmos a história recente do Brasil e, especialmente os processos eleitorais desde 1989, entenderemos o significado profundo das palavras do novo presidente. Elas soam quase como um desabafo e ao mesmo tempo como uma declaração de compromisso público. O desabafo de Lula é também o desabafo de milhões de brasileiros que, como ele, têm visto a cada pleito sucessivo o adiamento do momento de ser feliz. Collor venceu Lula baseando-se no medo, dizia que Lula confiscaria a poupança, que dividiria casas e terras dos pobres, entre muitos outros disparates típicos da prática do terrorismo eleitoral. FHC não foi tão explícito, mas foi eleito muito em razão do medo de ver-se perdida a estabilidade da moeda, tanto na primeira quanto na segunda vez. Agora, durante a campanha, no intuito de fazer uma virada, Serra novamente recorre ao medo, primeiro tentando vincular a crise de confiança do mercado financeiro ao medo de Lula, depois, no segundo turno, explicitou, nas palavras da "namoradinha do Brasil", o medo com tudo o que Lula poderia representar. Portanto, ao dizer que a esperança venceu o medo, Lula fez um desabafo em nome de milhões de brasileiros que, cansados da paralisia, querem caminhar. Esperança e medo são sentimentos contraditórios que ganham colorido político. A mobilização destes sentimentos de alguma forma traduz a força que o processo político tem no imaginário popular, a ponto de causar ação ou de causar fechamento. A esperança, em geral, põe as pessoas em movimento, as faz caminhar, as faz agir, as faz crescer. O medo paralisa, inibe o caminhar, faz conservar. Ao dizer que a esperança venceu o medo, Lula está convocando os brasileiros e as brasileiras para um compromisso: a ação, a participação, a construção de dias melhores, da felicidade. Indica concretamente a sua própria disposição, mas indica também que conta com a disposição de um País. Sem medo de ser feliz. Esta afirmação, presente nas campanhas de Lula desde 1989, traduziu-se em tentativa de fazer frente ao medo, de afirmar a esperança. Pode ser dita positivamente como: Esperança da felicidade. Desde os gregos, que inventaram a democracia, entende-se que a felicidade é a finalidade última do homem. A política a mediação para tal. Recuperando a idéia da felicidade como elemento central de ação política, Lula não só sinaliza concretamente o conteúdo de sua proposta de ação governamental, como indica o seu compromisso com a dignificação da política como mediação para tal. Tem afirmado inúmeras vezes que seu principal compromisso é com o diálogo, a negociação. Ora que outras palavras poderiam traduzir melhor o sentido da política numa sociedade democrática? Resta-nos esperar e trabalhar para que efetivamente possam ganhar lugar. A esperança venceu o medo soa como uma declaração de que o presente e o futuro do Brasil serão obra da ação comprometida de cada um e de cada uma dos/as brasileiros/as. Mais do que esperar que seja concedida, a sociedade brasileira quer participar do processo de construção de sua felicidade. A sociedade afirma que na política há espaço para tal e que está disposta a conjugar a urgência com a paciência, o ainda não com o já possível, na prudência que há de ir instaurando a justiça. *Paulo César Carbonari é professor de Filosofia e Coordenador do Movimento Nacional de Direitos Humanos (MNDH)

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