É cor de Rosa choque

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Publicado Terça, 06 de Novembro de 2012 às 10:53, por: CdB
O cineasta gay, Rosa von Praunheim, figura-chave na cinematografia alemã contemporânea, teve seu trabalho homenageado no CCBB respectivamente em São Paulo e no Rio de Janeiro com o título pouco feliz de "Imagens engagadas".
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A edição carioca da mostra que terminou nesse fim de semana com grande sucesso de público, exibiu entre outros a talvez o filme mais importante obra na extensa filmografia do diretor: "Não é o homosexual que é perverso e sim o meio  em que ele vive". A estréia do filme em 1971 causou enorme polêmica e foi um divisor de águas na sociedade da época, avessa a qualquer  tipo de discussão sobre um "fenômeno", "uma anomalia" que queria estabelecer como inexistente. A partir especificamente desse filme, vários grupos de homosexuais se formaram, passaram a ter uma voz tornando pouco a pouco possível a percepção de que haviam muitos outros em identidade escondida,  vivendo uma vida que, segundo a crítica do diretor, enrolados por um formato de sociedade burguesa  coniventes com a mesma e negando a sua própria identidade. Rosa von Praunheim critica o caráter apolítico  e apático dos homosexuais da época. Se não fosse esse filme, provavelmente a mostra "Panorama", a segunda mais importante do festival de Berlim não teria sindo fundada por Manfred von Salzgeber em 1980, na época incentivador do cinema alternativo com foco na temática gay na Berlim ocidental cercada pelo muro e permanentemente ameaçada pela guerra fria. Bate-papo Rio-Berlim via Skype Rosa von Praunheim, com o nome de batismo Holger Radtke, nasceu na Lituânia em 1942 durante a segunda guerra mundial e foi adotado por uma alemã, que o levou para Berlim, lugar propício para novas tentativas, novos discursos. Pelo fato dos habitantes de Berlim não serem obrigados a servir o exército, várias pessoas que procuravam um novo caminho, se encontraram na cidade nos anos '70 e '80, solo fértil para mudanças e discursos ousados. Depois da exibição e com um intervalo para ajustos técnicos, o público composto por cinéfilos, escritores, professores, cineastas e afins que lotavam a sala de cinema do CCBB carioca, tiveram a chance de participar de um longo bate-papo com o diretor, via Skype, diretamente do seu apartamento no bairro pacato de Schöneberg em Berlim. Ratificando o seu amor pela total improvisação, foi o próprio diretor que depois de duas horas, sem qualquer aviso prévio, como um gentleman, agradecendo, se despediu do público carioca. Perguntado durante o debate sobre se ocupa algum cargo político ele respondeu: "Sou inapto para ocupar um cargo político, já que prezo  mais que tudo a liberdade na minha arte", além de se declarar simpatizante de Klaus Wowereit, prefeito de Berlim e gay assumido. Rosa, como é carinhosamente chamada pelo amigos, co-cineastas e fotógrafos ao longo do tapete vermelho, aparece na tela do CCBB de chapeú rosa choque. Passeando pelas beiradas com um malabarismo invejável, o ratinho, Luise" como ele na sequência revelaria membro fixo da comunidade inusitada em que vive juntamente com seu ex-companheiro, o seu atual e mais duas cobras naquilo que essa chama de uma "comunidade pacífica". Sem pestanejar, o diretor filosofou sobre a baixa probabilidade de sobrevivência de "Luise" junto com as cobras caseiras, mas de dentes ferinos, disse ele. Instigando a platéia, mandou um discurso polêmico e taxativo: "As cobras comem os ratos. É a lei da natureza. Se isso acontecer, será brutal para Luise, mas será o seu destino", ousando o politicamente incorreto. O bate-papo, regado a muito conteúdo sobre filmes, sua vida pessoal, modo de viver como também com toda uma cenografia operativa. De acordo com o assunto. Quando o tema era  "Amor", do lado direto um imenso coração de plumas que balancava ao léu. Quando falava dos modelos alternativos da família contemporânea, exibiu um urso branco gigante, alegando este ser o número 59 dos 60 que teria em casa e que seriam seus filhos. A programacao do CCBB veio num momento-chave da vida desse diretor, introvertido no contato pessoal, mas que ousou na linguagem e temática. Ás vésperas de completar 70 anos, Rosa von Praunheim foi homenageado num dos de festivais de cinema de maior personalidade na Alemanha: O festival na cidade de Hof. Na bagagem, o diretor chegou com nada mais e menos que 70 curtas, sobre os mais diversos temas. O filme "Rosakinder" fünf seiner Schüler/Os filhos de Rosa, os seus 5 alunos" mostra o depoimento dos diretores Julia von Heinz, Chris Kraus, Axel Ranisch, Tom Tykwer e Robert Thalheim como o diretor/poeta/agitador os influenciou na percepção da sétima arte. O esgoto intelectual de todos os presentes foi muito bem expressado pelo tradutor Fernando Gil no final do debate, depois que "Rosa" já havia se despedido do público: "Em São Paulo eram só 5 pessoas presentes eu eu já fiquei cansado, mas com esse público, instigado, interessado e voraz, confesso...estou morto!", concluiu. A mostra do CCBB, em harmonia com o Zeitgeist pelo aniversário dos 70 anos do diretor e com ao ano da Alemanha no Brasil a partir de maio de 2013, ofereceu excelente possibilidade ao público de conhecer um dos mais instigantes diretores alemães da atualidade. Um provocador, um agitador e uma doce figura. Tudo isso. Não serão as falhas de áudio durante a projeção que ficaram na memória de quem participou do debate, mas de ter conhecido um dos mais importantes diretores contemporâneos e que apesar da uma dolorosa trilha pessoal e profissional, não perdeu a ternura, a vontade de agitar e principalmente a vontade de fazer filmes. Fátima Lacerda é Jornalista, Curadora de filmes radicada em Berlim desde 1988.
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