E agosto chegou...

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Publicado Sexta, 05 de Agosto de 2016 às 10:46, por: CdB

Para os últimos dias de agosto de 2016, os presidentes do STF e do Senado agendaram o capítulo final do processo de julgamento

Por Maria Fernanda Arruda - do Rio de Janeiro:
Agosto, mês de cachorro louco? Mês ventoso, trazendo impurezas no ar, que provocavam em passado remoto a caxumba, a catapora, o sarampo, a tosse comprida? Na História do Brasil, a morte de Vargas, em 1954; a renúncia de Jânio Quadros em 1961; a morte de Miguel Arraes e de vários políticos proeminentes. Para os últimos dias de agosto de 2016, os presidentes do STF e do Senado agendaram o capítulo final do processo de julgamento, por juízes da Inquisição financiada pelas elites, da Presidente da República eleita pelo povo. Quem são esses personagens, conhecidos sem dúvida, mas muito pouco pensados e refletidos?
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Maria Fernanda Arruda A recondução desejada de Dilma Rousseff à Presidência possa ser reconhecida como ato de vontade do povo, reelegendo-a mais uma vez
Quem presidirá o julgamento pela Inquisição? Pela letra da Constituição, o presidente do Supremo Tribunal Federal, Ricardo Lewandowski, um jurista medíocre, inseguro, muito bem-posto na presidência da Corte, que permite a ele a indefinição dos covardes. Lewandowski teve durante esse processo kafkiano, inúmeras oportunidades para ajustá-lo em termos de Direito, isso é, determinar seu arquivamento, lavrando despacho singelo: “querendo, voltem em termos”. Não o fez, que está comprometido com os interesses dos grupos políticos que representam os que padecem de alergia mortal e não podem conviver em Democracia. Seu momento de motivação maior, levando-o à imprudência e à leviandade, foi aquele em que se empenhou com bravura na lurta por proventos de mais substância, de mais moedas. Terá um mês para negociar e assegurar o que melhor convenha aos que defende. Não merece confiança e nem respeito. E nada será feito por ele, sem prévio acordo com Renan Calheiros, o que preside o Senado da República. Reconhecidamente um pulha, imoral, negociante de sua desonra, também terá 30 dias para conchavos, acordos e acertos, sem excluir qualquer diálogo, que em si possa ser negócio. Confiar nessa dupla de condutores do processo será, na melhor hipótese, infantilidade: não tendo a grandiosidade nefanda dos Cavaleiros do Apocalipse, ele são nefandamente pequenos. Corpo de jurados, os senhores senadores, sempre de acordo com a letra de uma Constituição que a maioria deles não possui competência para ler, a outros tantos faltando brio para reconhecer aquela escrita, serão os que decidirão sobre os destinos da República. Já então terá sido cumprida a etapa operisticamente bufa, desempenhada por uma Comissão Especial, com o seu relator, leitor de um texto preparado por terceiros, que a ele sabidamente faltam engenho e arte, só lhe restando o leme condutor da má-fé primária. E quem são os juízes dessa inquisição malcheirosa? Quem habita na Casa do Senado? Uma meia-dúzia e seis a oito políticos decentes e competentes: Lindbergh Faias, Vanessa Grazziotin, Paulo Paim, quem sabe também Katia Abreu (que a fidelidade em muitos momentos é virtude rara), Fátima Bezerra, Roberto Requião ( ? ),os que não cederam ao canto-de-sereia do Poder Econômico, levantando suas vozes no momento em que defender Dilma Rousseff foi e é mais ainda do que defender uma mulher honesta: é defender a Democracia, que só existe no Estado de Direito. E todos os outros. Há um grupo de crápulas estabelecidos, diplomados de longa data, histórias que enlameiam o Senado da República: Renan Calheiros, Fernando Collor de Melo, Ronaldo Caiado, Edson Lobão, Aécio Neves, Zezé Perrella, Jose Agripino, Flexa Ribeiro, Álvaro Dias, Jader Barbalho … Os ridículos e bufões: Romário, Martha Suplicy, Magno Malta (o escárnio ambulante), Cássio Cunha Lima, Rosilda de Freitas … Os procuradores do capital internacional e da máfia do petróleo: José Serra, José Anibal, Romero Jucá … A notável musa das direitas: Simone Tebet. E existem ainda os menos conhecidos, mas que são muitos, figuras toscas e marcadas por vícios de ética apodrecida: Sergio Petecão (sendo processado pelo STF), Benedito Lira (com seus bens sequestrados no esquema do Lava-Jato), Wellington Fagundes (processado por crime de peculato), Eunício Oliveira (denunciado por Decídio Amaral). O despudor senatorial é fartamente conhecido, mas valerá sempre lembrar nomes e figuras. O que esperar dessa associação de malfeitores? Eles em tempo algum isentarão a Presidenta. Mas poderão negociar. Aventureiros, sabem que poderão perder tudo, no correr do tempo, na passagem das eleições futuras. Negociações estão sendo feitas, interesses antagônicos se revelam, sem que se saiba ainda de alternativas que os aplainem. Ao PMDB interessa primeiro a blindagem contra os ataques que começam a ser feitos pelo juiz Moro, para que, se possível seguros, possam os seus agentes prosseguir no furto, no roubo e no estelionato: vocação incontrariável, os políticos do PMDB pensam pequeno: querem e sabem sobre a negociata e a corrupção que é inerente ao Estado Cartorial; já os que compõem o PSDB pensam muito alto, negociam o patrimônio nacional, agora e imediatamente o petróleo. Admitido que os aliados da Presidenta legítima aceitem negociar: como, com quem e em que termos? Até agora só se admitiu uma possibilidade: reconduzida ao cargo que o povo brasileiro lhe delegou, ela em seguida convocaria plebiscito, sobre a antecipação das eleições de 2018. Uma possibilidade que só existe em tese: não será nunca apoiada pelo Congresso e, sem ele, não poderá ser realizado. Vale como lance a ser experimentado em jogo que não será o de xadrez, pois as regras são flexíveis e e ajustadas a cada jogada. Entendido como Poder independente e separado, o Judiciário sabidamente tem agido cada vez mais como força política. O STF, lastimavelmente medíocre, comprometido pelos desmandos de Joaquim Benedito e de Gilmar Mendes, é um colégio de vaidades satisfeitas com seus parcos saberes jurídicos, vozes que produzem discursos de retórica vazia e anacrônica. Não apenas do Supremo é comprometido com os jogos de interesses políticos e econômicos, mas todo o Judiciário, que hoje tem seu farol e estrela-guia na figura lastimável de Sérgio Moro. Hoje, a Justiça Eleitoral tem sua autoridade maior na figura ridiculamente perigosa do mesmo Gilmar Mendes. O golpe, visando a derrubada de Dilma Rousseff, vem sendo tramado com competência, não enxergado e/ou não compreendido por um Ministro da Justiça inerte. A Polícia Federal, órgão subordinado ao Ministério da Justiça, tornou-se arma eficiente, voltada contra ela, Lula e o PT. O Procurador Geral da República e seus tristes cavaleiros sibilinos, esquivos, evasivos, podem colaborar na feitura do golpe, nunca opondo-se a ele. Tudo isso tem sido batido e rebatido. Mas não ficou espaço para enfrentarem-se os dois problemas decisivos: o equivocado TCU – Tribunal de Contas da União; e o descarado descumprimento da orientação fixado pelo STF. O TCU é órgão auxiliar do Congresso Nacional, com função de assessoramento. Não é órgão do Poder Judiciário e as suas decisões, de caráter administrativo não fazem “coisa julgada”. Em termos práticos e tradicionalmente, o TCU passou a existir como encosto confortável, destinado a políticos aposentados por muitos anos de uso, carecendo de seriedade e respeito. Jamais foi posto como instrumento para contestação do Poder Executivo. É presidido por Aroldo Cedraz, político baiano pequeno em expressão e em conhecimentos. Seu momento mais notável: em maio de 2009, o TCU editou uma resolução interna criando uma cota de passagens aéreas para 20 autoridades, com valores que variam de 14 mil reais a 43 mil reais. Tal cota, de acordo com o tribunal, deveria servir para "representação do cargo", ou seja, participação em congressos e eventos. Na prática as cotas estão sendo utilizadas pelas autoridades para prolongar finais de semana em suas cidades de origem. Aroldo Cedraz formou-se como veterinário, fazendo carreira política à sombra de Antônio Carlos Magalhães, tendo experimentado uma sequência de partidos, PRN, MDB, PMDB e PFL, até ser aposentado e posto então como ministro do TCU. O parecer do veterinário serviu como base para a celebração da teoria infame das “pedaladas”, Negou-se a atender à convocação feita pelo senador Tasso Jereissaty, alegando que não seria apropriada. O senador puxou-lhe as orelhas: “não cabe ao presidente do TCU definir o momento apropriado para atender a um convite do Legislativo, porque o tribunal é apenas órgão auxiliar do Congresso Nacional.” Houvesse minimamente competência e disposição para o trabalho, da parte do então Ministro da Justiça, e teria cumprido obrigação, fazendo uso das palavras duras e justas de um senador do PSDB, dirigidas ao veterinário disposto a cumprir seu papel na farsa do golpe. Não fez nada de coisa alguma, reverenciando indevidamente a figura pretensiosa e desonesta do dito veterinário. Ao contrário, desmanchou-se e desmancha-se em desculpas, informando que as decisões do TCU, assim que paridas, passaram a ser respeitadas (ele não sabe que as decisões aqui referidas são apenas recomendações, que se dirigem ao Congresso Nacional, a qualquer momento cabendo sua impugnação em Justiça). As preocupações de Cardozo, não voltadas para os deveres de seu cargo, deram pretexto ao pedido não menos que idiota, formulado por um homem que não coordena a própria boca (Miguel Reale Jr.) e por uma débil mental que não cala a sua (Janaína Pascoal), pedido que mereceu todo o prestígio já acertado de Eduardo Cunha. Temos assim um elenco de figuras indecorosas: o veterinário, o ministro relapso, Reale & Janaina e Cunha. Imperdoável foi a omissão, até hoje omitida, de um calhorda sustentado no Ministério da Justiça. O segundo ponto. O STF definiu que o Congresso analisaria apenas e tão somente as acusações apresentadas por Reale & Janaína: os decretos de créditos suplementares e as “pedaladas fiscais”. A Câmara ignorou sem cerimônia alguma a definição do STF e votou pela denúncia de Dilma Rousseff pelo que ousaram definir como o “conjunto da obra”. Todos os deputados que votaram pelo “sim” fizeram questão de proclamar aos berros alucinados que não respeitavam o STF, permitindo-se um “voto de desconfiança”, confundindo-se num parlamentarismo inexistente. O STF fez “ouvidos de mercador”, associado ao projeto de golpe, aceitando-se menor e debochado poder, ridicularizado por uma Câmara formada por ratazanas dementes. O que fez/não fez o Ministro da Justiça? A partir da sessão que os deputados fizeram infame, um advogado de competência mediana teria obtido o pronunciamento do Supremo (provocado a isso, ele teria que se manifestar), para anulação daquele aborto jurídico. Cardozo em braços amáveis. Tornou-se o Calabar dos tempos de hoje.
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Como imaginar que algo decente venha a ser dado à luz pelo Senado, se todas as elites, a econômica, a social, a jurídica, a política desejam submeter o povo brasileiro a uma escravidão reconstruída pela disseminação da miséria que já estava extinta? Presos a um fio de esperança, imaginamos um “saber fazer” até hoje não mostrado, capaz de costurar acordos e firmar compromissos. Admitido sucesso nessa empreitada, restará a questão maior: a devolução da Presidência da República a quem o povo escolheu valerá o preço que tenha sido exigido? O mais provável, sejamos realistas, é a negação. Dilma Rousseff só será mantida, se assegurada a plena impunidade para os crápulas do PMDB (Renan Calheiros, Jucá, e algumas centenas de ladrões sob comando de Barrabás, e se ao mesmo tempo aplacada a fome desmedida da máfia que tem seu maior procurador em José Serra, mas que é não menos que o neoliberalismo que empresta vida ao PSDB. Desde os primeiros movimentos golpistas, as pessoas e organizações mais lúcidas trataram de fazer pública a sua indignação, defendendo a Democracia e o Estado de Direito, ao mesmo tempo deixando claro que não se movimentavam em favor de um governo equivocado, como o que Dilma Rousseff vinha acometendo, em si injustificável - nada de mais correto poderá ser construído a partir de uma retomada do poder por ela, se não reconhecida a quantidade assustadora de erros e equívocos cometidos. A injustiça, a violência, a mentira dos seus inimigos é que a tornam querida, respeitada e mesmo amada pelos brasileiros. A voz de Dilma Rousseff vai se fazendo a voz de muitos milhões de brasileiros. E é isso que jogará em seus ombros uma responsabilidade imensa, para que não se frustrem de forma doída os sonhos desses todos. O que se espera de Dilma Rousseff, em resumo? 1. Os equívocos cometidos sob comando de Joaquim Levy, acumulando-se durante 11 meses, e que vão sendo plagiados por Henrique Meirelles, não poderão repetir-se. Com formação aceitável na área, Dilma não poderá aceitar por acomodação política o neoliberalismo monetarista que o FMI pretendeu sempre e defende, em nome do capital privado internacional. Que ela conte com um Ministério do Planejamento, competente para desenhar e implementar um modelo econômico, que pretenda o progresso, mas subordinado sempre ao respeito à dignidade humana e do meio-ambiente. 2. Imprescindível o respeito à imensa riqueza do petróleo do pré-sal, afastando-se em definitivo as investidas da “máfia” que usa José Serra e sequazes como procuradores, com a destinação de seus resultados ao programa de Saúde – Educação – Moradia, isso posto como cláusula pétrea de uma Constituição democrática. Dilma não pode acordar com as pressões de Jucá e similares, mas caminhar com o povo pelas ruas, numa renovação da campanha do "O petróleo é nosso". 3. Curar definitivamente a tosse da vaca: empenhar-se no aperfeiçoamento da Legislação do Trabalho, ouvindo os verdadeiros representantes dos sindicatos e criminalizando as novas formas de exploração do trabalho, nascidas com a informatização nos serviços e nas oficinas das fábricas. 4. Em substituição às concessões absurdas, feitas aos agroindustriais, os que impuseram o modelo de agricultura de exportação, baseada no latifúndio e viabilizada com o uso indiscriminado de agrotóxicos e transgênicos, uma política preocupada com a grande fonte geradora de divisas, mas em primeiro lugar com a humanização do mundo rural, respeitando-se os povos indígenas e os camponeses. Um governo ético não poderá prosseguir tolerando pistoleiros, os que abrem espaços para as mineradoras, as serrarias e os construtores de pastagens, ao preço do desflorestamento. O Brasil deseja o “progresso” a qualquer preço? Que se consulte o povo. Durante o governo Dilma, não se fez praticamente nada nesse sentido. 5. As empresas estatais, em áreas do petróleo e siderurgia, sabem operar com grande competência técnica, mas a sua gestão financeira precisa estar livre das negociatas políticas, trocas de favores ilícitos. Os traços lastimáveis de um Estado Cartorial (aquele que transforma suas tarefas em mecanismos para favorecimento de sócios e protegidos) precisam ser eliminados radicalmente. Governo do povo não faz uso do dinheiro do povo para fazer a alegria debochada de bandidos fantasiados como políticos. 6. A política do “bem-estar”, na forma de programas, como o “Minha casa, minha vida”, o “bolsa família” precisa ser posta a salvo dos ataques movidos pelos senhores da “casa-grande”. Essa obra maior dos governos do PT, além de servir com pertinência à divulgação e promoção de um governo de e para o povo, e uma vez assegurada a sua continuidade, precisa ser aperfeiçoada. E, se já foram capazes de integrar milhões de brasileiros, deve aumentar em objetivos e visar padrões de qualidade mais altos. 7. É evidente a necessidade de retomada e dinamização dos programas na área da Saúde, desfazendo-se os crimes programados pelos governantes interinos. Passos à frente são mais que necessários: os crimes da máfia de branco, dona dos planos privados de saúde, precisam ser punidos e esse “mercado” precisa ser saneado e disciplinado, por respeito aos brasileiros . O povo brasileiro ainda é um povo doente, desdentado, anêmico, exposto ao que as deficiências de saneamento básico precário: os brasileiros precisam de redes de esgotos e de água tratada. 8. A democratização do ensino, abrindo-se as escolas ao povo, teve seu único momento nos governos trabalhistas, com Lula e depois com Dilma. Obtida a primeira e decisiva vitória, que se pode simbolizar no “regime de cotas”, é preciso e urgente avaliar, rever, corrigir distorções, cortar definitivamente os canais que alimentam a “máfia do ensino”. O modelo posto em prática foi em muitos pontos apropriados pelos que fazem atos de comércio, sem qualquer preocupação educacional. Impedir as metas alienadoras que a FIESP e congêneres procuram impor. 9. É preciso, e isso está ligado ao projeto para uma verdadeira Pátria Educadora, que se regulamente e se façam cumprir os procedimentos que sejam definidos para a Mídia, especialmente no seu conteúdo, que não pode servir a interesses políticos das elites, e que deve necessariamente atender, antes das vontades dos “anunciantes”, a um programa amplo de educação e promoção daquela que é de verdade a cultura do povo brasileiro. 10. Por último, mas não o menos importante, um novo governo Dilma Rousseff deverá começar com o que lhe será a tarefa mais fácil e onde poderá atingir resultados da maior expressão: a Cultura, onde Lula, com Gilberto Gil e Juca Oliveira, produziram-se resultados notáveis. Companheira Dilma, existem áreas que não podem servir como moeda de troca por favores políticos: educação, saúde, habitação, emprego, preservação do meio ambiente, respeito à cultura do povo, feita pelo povo e para o povo. Não se esqueça, faça-se de verdade a voz de milhões de brasileiros. A recondução desejada de Dilma Rousseff à Presidência, para que se respeite a Democracia e o Estado de Direito, se transformada de sonho em realidade, que não seja resultado de acordos negociados pelos corredores do Poder de Brasília, mas possa ser reconhecida como ato de vontade do povo, reelegendo-a mais uma vez. Maria Fernanda Arruda é escritora, midiativista e colunista do Correio do Brasil, sempre às sextas-feiras.
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