Quatro anos sem Tim

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Publicado Domingo, 04 de Junho de 2006 às 18:59, por: CdB

Há exatos quatro anos foi assassinado o jornalista Tim Lopes. O triste aniversário é praticamente ignorado pela mídia e até agora mereceu lugar somente em pequenas notas nos jornais ou em brevíssimos comentários nos telejornais. Assim como quase tudo que um dia virou notícia, a agonia de Tim após ser capturado por traficantes de drogas na favela Vila Cruzeiro (Complexo do Alemão, Zona Norte do Rio de Janeiro) no dia 2 de junho de 2002 deixou aos poucos de causar comoção nacional e foi caindo no esquecimento popular, suplantada pela sucessão sem fim de tragédias cotidianas.

Coincidentemente, no mesmo dia em que a morte de Tim Lopes é relembrada com dor e revolta por familiares, amigos e colegas de trabalho, os jornais do Rio trazem em suas edições fotos de seus próprios repórteres, acuados atrás do célebre Caveirão (carro blindado utilizado pelo Batalhão de Operações Especiais da PM do Rio), durante intenso tiroteio entre policiais e traficantes. A batalha aconteceu no Morro da Providência, a um quilômetro do centro financeiro do Rio, e surpreendeu as equipes de reportagem que, em plena luz do dia, acompanhavam o Bope numa investida para cumprir mandados de prisão. O jornal O Globo traz até mesmo um relato em primeira pessoa da excelente repórter Cristiane de Cássia, onde ela revela que nem os cursos de aperfeiçoamento que fez ou os dez anos de experiência acumulados na cobertura policial carioca a livraram de sentir muito medo de morrer enquanto o barulho das balas se tornava cada vez mais próximo.

Pensando no susto vivido por Cristiane e os demais colegas e na martirização de Tim, percebo que nada mudou nesses quatro anos no chamado "jornalismo policial" dos principais veículos brasileiros. A cobertura, mais do que nunca, se concentra no relato diário dos crimes, execuções e demais barbaridades comuns às principais cidades do Brasil. Esse relato sempre vem acompanhado de um subtexto editorial que serve a perpetuar tanto o medo das classes alta e média quanto a estigmatização dos pobres e favelados, em nada contribuindo para solucionar verdadeiramente o problema da violência ou apontar para a efetivação de uma política de segurança pública séria no país.

No dia-a-dia, a relação da imprensa com a estrutura policial corrupta é baseada na hipocrisia. Mesmo pra lá de manjadas, as execuções periódicas que a polícia promove nas favelas sempre geram notícias que trazem a versão da própria polícia sobre o "auto de resistência". As mães dizendo que seus filhos mortos eram trabalhadores também estão sempre lá, mas a cobertura policial dos grandes jornais brasileiros acostumou o leitor ao dito pelo não dito. Para o cidadão que recebe as notícias, é difícil distinguir o que é mentira e o que é verdade, impossível diferenciar nas entrelinhas do texto o traficante fortemente armado morto em confronto do inocente executado com tiros a esmo ou à queima-roupa. O jornalismo policial brasileiro é um jornalismo baseado mais em versões do que em fatos.

Somente situações excepcionais, como a recente matança em São Paulo ou as Candelárias e Carandirus da vida, são capazes de instigar a grande imprensa a tratar a questão da violência pela ótica dos direitos humanos. Mesmo assim, os sintomas da "doença" são passageiros e a cobertura policial sempre acaba voltando rapidamente ao "normal". A relação hipócrita dos principais veículos de mídia com a polícia e com a própria notícia policial é uma questão de cultura editorial há muito enraizada. Os repórteres policiais, na linha de frente e tendo a própria polícia como principal fonte e proteção, pouco podem fazer para alterar essa realidade. O trabalho deles, diga-se de passagem, é digno de louvor porque exige coragem e jogo de cintura.

Lembranças

Eu trabalhei com Tim Lopes no jornal carioca O Dia, em 1991 e 1992. Naquela ocasião, eu começava minha carreira como estagiário no popular periódico da Rua do Riachuelo e ele já era um repórter consid

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