Madeira no leilão: quem disse que o futuro tem preço?

Arquivado em:
Publicado Domingo, 19 de Novembro de 2006 às 08:59, por: CdB

O rio Madeira, maior afluente do Amazonas, está às vésperas de ser transformado em um eixo exportador de matérias primas e em um escoadouro de energia. Furnas/Odebrecht pretendem implantar as bases iniciais do Complexo do Madeira, um projeto da IIRSA- Iniciativa de Integração da Infra-estrutura Regional Sul Americana, com o objetivo de criar um corredor bi-oceânico através de uma hidrovia industrial que passaria por território brasileiro, boliviano e peruano em direção ao Pacífico através de quatro hidroelétricas. Santo Antonio e Jirau são as primeiras. Em Porto Velho, se dá a ignição da incorporação desse território sob nova diretoria, sob nova jurisdição, e nova base econômica.

O segundo Governo Lula, consubstanciando sua aliança estratégica com o capital financeiro e com o agronegócio - Blairo Maggi à testa -, está sendo obrigado a entregar o Madeira como prova de compromisso. Prova de que o enclave econômico será também enclave político. Os barramentos de Santo Antonio e Jirau, apresentados como solução para o Apagão, são na verdade dois degraus serviçais para passagem da sangria nacional, que não mais será sangria, mas fluxo "natural" de um corpo econômico transnacional de grãos, minérios e madeira, em formação nessas bandas.

Ao se ler o artigo publicado na Carta Maior pelo historiador Chico Teixeira no dia 16 de novembro, até parece que foi enviado pelo governo para defender o pacto de desterritorialização do Madeira e do chamado corredor noroeste. Começa dizendo que as Usinas seriam um "passo fundamental para superar o isolamento da região". Isolamento em relação a que? Ao Centro-Sul? O retrato do colonizado nos olhos do colonizador. A Amazônia como ilha, barreira, obstáculo. E lá vem eles nos "salvar" com energia barata para servir a industria multinacional do alumínio, nos "salvar"com hidrovias, represas e estradas para os cinturões de monocultivos, nos salvar do passado e nos trazer o futuro. Se o "futuro do Brasil mora em Rondônia", como diz o Vaz Caminha emprestado, é apenas casualidade que estejam fazendo disso aqui um imenso ralo?

Pela magnitude do Projeto do Complexo do Madeira, sua operacionalização demanda ajustes institucionais, na verdade esgarçamentos institucionais, a partir do licenciamento ambiental. Exatamente por esse motivo é que a flexibilização da regulamentação ambiental tornou-se agenda consensual e prioritária do setor de infra-estrutura altamente concentrado, do agronegócio, do sistema financeiro internacional, e do Governo Federal. É a pedra de toque do "novo ciclo de crescimento" impulsionado por investimentos em plataformas de infra-estrutura voltadas para exportação. O licenciamento das usinas do Madeira será o marco dessa partilha de soberania, servindo como referencial facilitador, uma senha para o enquadramento da Amazônia nos eixos programados pelos grandes projetos previstos para a região e que estão na fila do Madeira: Belo Monte o próximo. Por isso o historiador convocado a narrar a história da dominação, edulcorada e estendida ao futuro , precisa "realizá-la" no próprio discurso, de modo publicitário, dizendo que a questão é "transformar o Projeto Madeira em um paradigma do desenvolvimento auto-sustentado."

O paradigma é submeter-se ao cronograma, métodos e dinâmicas dos grandes investidores, proporcionando acumulo de capital suficiente para que políticas compensatórias ganhem eficiência em igual medida. A sustentabilidade que querem garantir é a dos negócios, e os negócios precisam de estoques naturais e de estoques sociais. Por isso as áreas de reserva e de proteção, propostas como medidas mitigatórias, serão geridas na área do Projeto sob a vigência de um regime de concessão de florestas que institucionaliza a formação de reservas de "capital natural" e de um regime fundiário obediente à lógica da regularização da expansão do latifúndio monocultor e pecuarista. Por isso, tantas promessas de benefícios sociais antecipadas com subempreg

Tags:
Edição digital

 

Utilizamos cookies e outras tecnologias. Ao continuar navegando você concorda com nossa política de privacidade.

Concordo