O governo e o PT endureceram o discurso contra as ocupações de prédios públicos promovidas pelos sem-terra. O ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu, repetiu ontem que é preciso respeitar "os limites da democracia" e informou que, ao contrário do que vinha sendo divulgado, não está nos planos do governo rever a medida provisória que considera crime invasões de terras e retira do programa de reforma agrária, pelo prazo de dois anos, as terras invadidas. Editada pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso no auge de uma onda de invasões do MST em todo o País, a MP derrubou drasticamente o número de ocupações. Dirceu aproveitou sua ida ao Congresso para criticar a invasão de prédios públicos pelos sem-terra: "O ministro (Miguel Rossetto, do Desenvolvimento Agrário) já divulgou uma nota e estabeleceu os limites do governo, que são os de respeito aos limites da democracia." Apesar de reafirmar as críticas aos abusos dos sem-terra na ocupação das sedes do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) em Goiás e Mato Grosso nos últimos dias, Dirceu tentou eximir o Movimento dos Sem-Terra (MST) de responsabilidade pelo ocorrido em Cuiabá, onde o prédio foi depredado. "No caso de Mato Grosso, não é o MST que fez a ocupação", alegou. Dirceu afirmou ainda que Rossetto lhe garantiu que não havia razões para a ocupação do Incra em Goiânia, onde mulheres e crianças do MST questionaram a indicação do superintendente regional da autarquia. "Mas é preciso conversar com o MST, porque há notícias desencontradas", ressalvou. A Polícia Federal ainda está apurando a responsabilidade pela depredação em Cuiabá, onde integrantes do MST e dissidentes do Movimento dos Trabalhadores Assentados e Acampados (MTA) entraram em choque. Na prática, entretanto, os dois grupos participaram da invasão da sede do Incra e devem ser responsabilizados. O presidente do PT, José Genoino, reforçou a ofensiva e disse que não é com invasões e atos violentos que o MST conseguirá intimidar o governo. "Não é assim que se trata um governo comprometido a fazer a reforma agrária e há apenas dois meses no poder", criticou. Genoino pediu responsabilidade aos líderes dos sem-terra, argumentando que eles podem distanciar da sociedade um movimento que conta com sua simpatia. "O respeito é bom, porque nesta relação não existe mão única, mas duas mãos." "Local" Líderes do PT ligados aos sem-terra tentaram descaracterizar os episódios do carnaval como uma ação articulada do MST de alerta ou contra o governo. "São questões locais e não uma decisão do movimento. O MST sempre teve como posição preservar o patrimônio público", disse a deputada Luci Choinacki (SC), do núcleo agrário do PT na Câmara. Segundo ela, o MST sempre deu tempo a todos os governos. Mas no caso do governo Luiz Inácio Lula da Silva tem um papel a cumprir. "Os movimentos sociais só têm a ajudar o governo Lula. É a luta social que faz o governo avançar na política." Apesar da negativa de Dirceu de que o governo estuda rever a MP que criminaliza as invasões e suspende as vistorias por dois anos nas áreas ocupadas, o presidente do Incra, Marcelo Resende, confirmou ontem que os técnicos sob seu comando estão debruçadas na análise da MP e deverão apresentar uma proposta de mudança na legislação. "Entendemos que se faz necessária uma nova medida ou incluir mecanismos que a tornem mais eficaz", disse. Resende ressalvou que qualquer alteração será uma decisão de governo Lula. Mas sua opinião particular é de que a criminalização das invasões de terras deve ser retirada da MP. "A idéia, para ser muito claro e objetivo, é acelerar o processo de arrecadação (obtenção) de terras. Todas aquelas medidas que não convergirem nesse sentido devem ser eliminadas."
Rio de Janeiro, Sexta, 29 de Março de 2024
Governo desiste de rever medidas provisórias antiinvasões
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Publicado Sexta, 07 de Março de 2003 às 13:28, por: CdB
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