Brizola tornou-se o eterno presidenciável

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Publicado Terça, 22 de Junho de 2004 às 06:23, por: CdB

Sete da noite, o aparelho deu dois toques até que troquei o teclado do micro pelo fone. Alô, boa noite, Sr. Mazzini, aqui é o Leonel Brizola - disse ele. Respondi atentamente, mas não esperava receber seu telefonema. É uma surpresa, reforcei, refeito do susto perante a voz rouca com seus 60 anos de política do outro lado.

Era uma noite do fim de 2001, estava na redação e esperei o melhor de um papo, sabedor de que o velho caudilho era chegado a uma prosa. Conversamos uns dez minutos, pouco para ele, tempo razoável para um repórter em fechamento de edição. Ligara para saber por que eu publicara, naquele dia, que Brizola não seria candidato à presidência no ano seguinte. Notícias de assessores - me defendi, sem dar tempo de ele terminar a frase. Agora sou eu é quem fala: sou um eterno presidenciável.

Tomei aquela frase do ex-governador como um resumo de seu perfil. Brizola, mesmo sem governo, sempre será um presidenciável. O currículo lhe garantiu isso, até esta semana, quando o coração parou, em um hospital do Rio, confidente de 82 anos de luta. Esta para nascer um homem tão nacionalista.

Reza a cartilha da boa conduta que amigos e inimigos, aliados e adversários poupem publicamente de críticas um saudoso. Isso é natural na hipócrita sociedade. Dá-se o real valor ao ser humano e seus feitos quando parte desta vida, mas nos acostumamos a relevar a importância da obra em detrimento dos defeitos. Quero dizer que Brizola foi um inigualável líder político na História do Brasil, ao passo que, não escapa aqui de ter registrados, sob minha visão, algumas de suas incoerências.

Cunhado de João Goulart, ingressou cedo na política, já militava aos 22 anos, foi deputado e governador do Rio Grande do Sul, quando escreveu suas primeiras imortais páginas de vida pública ao conclamar o povo a pegar armas contra revolta militar. A tentativa de golpe fracassou e o jovem cresceu, assim como sua ambição. Não tardou em ganhar o Brasil em campanha com Jango, mostrar sua cara e seu discurso bravio, o que lhe transferiu o carisma e poder para o Estado do Rio de Janeiro, onde governou por duas gestões.

Amado e odiado, inegável passar em branco nas páginas do poder tupiniquim. Como também os desafetos que fez pelo seu jeito autoritário em lidar com questões administrativas. A idade elevou em Brizola a consciência de sua importância para o país, tanto que, no ímpeto peculiar de liderança, perdeu amizades políticas. Fez escola: César Maia, prefeito do Rio, Saturnino Braga, ex-prefeito e senador três vezes, e Anthony Garotinho, governador. O trio saiu do PDT, em momentos distintos, por discordar da visão do gaúcho. Brizola, por mais coerente em certas questões, em alguns momentos fechava os ouvidos. Neste meio em que a vaidade é o motor da vida, isso torna-se uma rocha no caminho para os outros ambiciosos.

No último encontro que tive com ele, no Rio, na sede do PDT, comprovei que o homem era sedento de poder - para plagiar o bordão popular, quem já foi rei, não perde a majestade. Ele saía de uma reunião com a Executiva do partido para decidir se aceitava a volta de Garotinho - que, mais tarde, resolveu debandar para o PMDB, sua atual legenda. Perguntei ao caudilho se as arestas haviam sido aparadas entre ambos. Olhou-me com atenção, ficou mudo uns instantes, refletiu e soltou a máxima: em política, podemos dizer que nossas cicatrizes foram curadas. No entanto, acabou levando uma rasteira do ex-afilhado.

O último alvo era Lula. Brizola, de aliado, passou a criticar o presidente. Dizem muitos, no ninho pedetista, que se trata de uma promessa de campanha mal cumprida. Lula havia prometido alguns ministérios, deu apenas um, porque da campanha para o poder a porta se torna estreita. Insatisfeito, tornou-se voz destoante no Planalto, uma buzina nos ouvidos do companheiro petista que não pararia tão cedo.

Eloqüente para os aliados ou mestre em

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