Ato contra homofobia em São Paulo homenageia militante LGBT assassinado

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Publicado Segunda, 26 de Novembro de 2012 às 14:34, por: CdB

Na semana passada, o militante LGBT Lucas Fortuna foi morto a pancadas em Pernambuco; desde 2002, ele usava saias pois dizia que “vestir saia é uma ação transgressora do próprio gênero”, já que se convencionou que a vestimenta só deve ser usada por mulheres

 

26/11/2012

José Coutinho Júnior

de São Paulo (SP)


“Estamos mais uma vez nas ruas para pedir a criminalização da homofobia. Semana passada, o militante LGBT Lucas Fortuna foi morto a pancadas em Pernambuco. Nós sabemos que ele não é o único. Em São Paulo, já tivemos casos aqui na Paulista e na periferia. Não queremos mais mortes no Brasil. É necessário criminalizar a homofobia já, que se aprove o PLC 122.”

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

A cada momento que o farol da avenida Paulista em frente ao MASP fechava, cerca de 150 homens e mulheres vestindo saias iam a frente dos carros carregando cartazes, faixas e um megafone para denunciar a violência cometida contra os LGBTs no Brasil e pressionar pela aprovação do PLC 122, projeto de lei que propõe a criminalizaçãoda homofobia no país. O ato ocorrido no sábado (24) foi motivado pela morte do jornalista e militante Lucas Fortuna, assassinadoa no dia 17 de novembro, em Pernambuco, pelo fato de ser homossexual. 

“Conheci o Lucas em 2006, em Recife, no primeiro encontro da Executiva Nacional dos Estudantes de Comunicação Social (Enecos) que fui, começamos a beber e conversar, e ele sempre tinha um bom humor fantástico, sabendo da importância da seriedade política e do bom humor, e eu tive uma empatia com ele muito grande. Inclusive quando ficamos sabendo da morte dele, as pessoas da minha geração da Enecos começaram a trazer fotos da época dele na Executiva, da questão do movimento pró-saia, que foi ele quem colocou, e víamos as fotos e relembramos dele e das situações que vivemos juntos. Acho que para toda uma geração que militou com ele foi uma perda muito grande”, relata a militante, jornalista e amiga Luka Franca.

O movimento pró-saia começou em 2004 na Executiva por conta de Lucas. Durante o Congresso Nacional dos Estudantes de Comunicação Social (Cobrecos), uma saia amarela chamou atenção pelo fato de um homem usá-la. Lucas, na época estudante de jornalismo e que usava saias desde 2002, pois dizia que “vestir saia é uma ação transgressora do próprio gênero”, já que convencionou-se que a vestimenta só deve ser usada por mulheres.

Ele viu no Congresso uma oportunidade para, além de afirmar sua sexualidade, pautar o debate de gênero no movimento estudantil. No entanto, Lucas foi alvo de preconceito por algumas pessoas presentes. Após as manifestações homofóbicas, mais de 100 homens presentes no encontro, em solidariedade ao colega e vendo a importância de se pautar o debate, começaram a ir para as plenárias de saia.

Foi para homenagear Lucas que todos no ato estavam usando saia. E numa tarde quente como a daquele sábado, os homens de saia faziam inveja a quem estava de calça e tinha de suportar o calor. “Eu nunca tinha usado saia antes, e acho que o preconceito de homens em usá-las devia ser quebrado. É muito confortável e refrescante, como se eu estivesse andando só de cueca”, diz Marcos Berto, militante LGBT presente no ato.

 

PLC 122 

 A morte de Lucas está longe de ser um caso isolado. O Brasil é o país que registra o maior número de agressões a homossexuais, movidas a puro preconceito, em todo mundo: somente este ano, 301 LGBTs já foram assassinados.

Para o militante LGBT Luiz Arruda, a violência ocorre “porque o Brasil é um país extremamemte machista. Uma pesquisa recente mostrou que a homofobia está mais ligada à transgressão de gênero do que propriamente à homossexualidade. Se a pessoa é homossexual, mas não tem trejeitos de homossexuais nem se assume publicamente, ele sobrevive. Agora, se ele assume ou é mais afeminado, ele é vítima de violência. É preciso lembrar que além dessa violência que culmina em morte, todos os dias muitos LGBTs sofrem xingamentos, espancamentos, constrangimentos, e eles não tem nenhuma arma legal para evitar isso”.

O Projeto de Lei Complementar (PLC) 122/06 é o instrumento legal que a comunidade LGBT espera para diminuir as agressões e o preconceito. O projeto tem como função criminalizar atos de discriminação motivados pela orientação sexual de quem está sendo discriminado.

Se aprovado, o projeto alterará a Lei de Racismo, que atualmente pune a discriminação por cor de pele, etnia, origem nacional ou religião, adicionando a questão de gênero à lista. No entanto, o projeto está parado no Senado Federal, sem persperctiva de quando será votado. A senadora Marta Suplicy (PT), antiga relatora do projeto, assumiu o cargo de Ministra da Cultura, e até agora não se decidiu novo relator para dar continuidade ao processo.

Luiz Arruda acredita que a aprovação do PLC 122 é estratégica e importante, mas o aparato legal é só o primeiro passo. “O avanço vai ser grande mesmo quando a educação nesse país for implementada realmente. A homofobia somente vai acabar com conscientização e educação da sociedade de que a orientação sexual de uma pessoa não é motivo para discriminá-la”.

 

Lucas Fortuna, presente!

A forma com que Lucas sempre lidou com o preconceito e a discriminação ao seu redor foi por meio da luta política. Por isso sempre se engajou no movimento estudantil, sendo dirigente da Enecos, na política institucional, militando no PSOL e depois PT, e na causa LGBT.

“O Lucas não estava numa linha de combate do tipo ‘se o meu estiver resolvido, o dos outros não interessa’. Acho que para todo mundo a morte dele é uma coisa que foi tão brutal, pois nunca esperamos que um crime de homofobia aconteça com alguém próximo a nós. A luta do Lucas foi contra a homofobia, foi por causa da homofobia que ele morreu, e nós como amigos e como militantes temos a tarefa de transformar nosso luto em luta. Mesmo que a vontade seja de chorar, precisamos transformar isso em algo efetivo”, finaliza Luka.

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